quinta-feira, 23 de dezembro de 2010

ENTRE UMA DROGA E OUTRA

ENTRE UMA DROGA E OUTRA
           
Ventilam por aí notícias de movimentos que se organizam, para obterem a liberação de drogas consideradas leves. Na Argentina, a maconha já obteve absolvição da justiça, “desde que seu uso seja acompanhado de uma intensa campanha de conscientização sobre os malefícios que causa”. No Brasil, acontecem alguns congressos, capitaneados por autoridades de renome nacional, com o mesmo objetivo de liberar certas drogas.
            Enquanto isso, na Espanha duas crianças foram internadas por estarem viciadas no uso de celulares. “As duas mostravam um comportamento perturbado e isto era notado nos problemas (sic) na escola, além de terem graves dificuldades para levar uma vida normal”, disse a médica. Os pais a presentearam com os telefones há 18 meses e, desde então, as crianças faziam de tudo para conseguir dinheiro, gasto nos celulares. Mal se alimentavam, ficavam irritadas com freqüência e demonstravam um comportamento anti-social.
            Da mesma forma, muitas são as crianças dependentes de outros aparelhos da modernidade, em especial computadores, videogames, jogos eletrônicos e aparelhos musicais. Vivem num mundo virtual, quando não um mundinho particular, que as isola dos deveres e da realidade, pela falta de interlocutores ou de atividades grupais de lazer. Isolam-se em seus castelos de posses e interatividade fictícia, pois ao mesmo tempo em que estão sintonizadas com a evolução tecnológica, são tristemente marginalizadas pela falta de calor humano. Viciam-se no individualismo coletivo de um mundo globalizado.
            Qual a pior das drogas? Aquela que vai direto à veia e perfaz a corrente sanguínea em direção ao cérebro ou aquela que do cérebro atinge o coração carente de amor, de relacionamento, de atenções e carinhos? Ambas são fatais - não estou aqui para aumentar ou diminuir a nocividade de uma em detrimento da outra -, mas, antes de abrir mão das leis que penalizam as drogas leves, precisamos impor restrições às drogas que nos alienam sem nossa percepção. A pior delas vem embalada como belos presentes, quitutes da tecnologia que afagam momentaneamente os corações das crianças e isentam certos pais de suas culpas no trato com os filhos. Empanturrar crianças com mimos da modernidade, sem um mínimo de critérios ou normas familiares, é uma forma de “abafar o silêncio” dentro de casa, a falta de tempo, de diálogo, de amor. Aqui começa o caminho das drogas.
            Há de se destacar que drogas existem onde inexiste o amor. Onde a infância não foi vivida na sua plenitude, na simplicidade de sua poesia, tempo de descobertas, de aventuras, de tombos e de saltos, de risos e lágrimas muitas vezes. Dizia o poeta Monsaraz: “Triste daquele a quem falta/Na vida que se evapora/Uma criança que salta/Que canta que ri e chora”. Uma criança livre, porém amada! Sem necessidade de nada que justifique seu desinteresse pela família, pela escola, pela vida.
            Agora, entre uma droga e outra, a pior delas é essa preocupação farisaica em graduar seus malefícios. Essa é leve, aquela fatal. Essa pode, aquela não. Como se a simples classificação pudesse redimir a sociedade de suas culpas em relação ao uso delas. Tudo que conduz a atitudes de fuga do indivíduo – mesmo o isolamento voluntário, a insanidade de alguns e o indiferentismo de outros – é sintoma de um mal maior: a falta de afetividade entre seus pares. Acima da lei está a liberdade de escolha dos próprios caminhos. A escolha certa se dá com o natural discernimento entre o que é bom ou ruim. Discernimento que nasce de uma referência positiva na vida. “Tudo me é permitido, mas nem tudo convém. Tudo me é permitido, mas eu não me deixarei dominar por coisa alguma” (1 Cor 6,12).
WAGNER PEDRO MENEZES wagner@meac.com.br

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