domingo, 13 de julho de 2014

FÉ E POLÍTICA JUNTAS

FÉ E POLÍTICA JUNTAS
            Janeiro de 1982. Ainda namorando meu possível ingresso no Instituto MEAC, grupo missionário de leigos católicos, fui convidado a uma reunião especial em São Paulo. Numa residência simples o dono da casa nos reuniu num anexo onde mantinha pequena biblioteca, escrivaninha e várias almofadas. Ali nos acomodamos – um grupo de aproximadamente dez pessoas, dentre as quais Neimar de Barros, Arthur Miranda, Jean Carlo, José A. Fonseca, José Geraldo, Urbano Medeiros e o dono da casa, Antoninho Tatto – e ficamos em oração, à espera do palestrante do dia. Eis que, com sua pontualidade sempre britânica, chegou o homem, sorriso de paz e olhar amigo. Sem cerimônia alguma, logo se acomodou num canto e se fez um conosco.
            Tratava-se de Plínio de Arruda Sampaio, político e ícone do catolicismo brasileiro por suas posições sempre coerentes com as diretrizes da Igreja. Apresentado ao grupo, fixou nossos olhos ciente de estar diante de pregadores cristãos e foi logo dizendo: “Antes cristãos com vocação política do que políticos sem vocação cristã”. Foi o primeiro nocaute de uma pregação clara, convincente, enraizada em um testemunho pessoal, que mudou radicalmente minha visão do mundo político dentro de uma realidade cristã. A partir dessa reunião compreendi ser impossível o exercício da fé sem participação política; como também extremamente danoso o exercício político sem as diretrizes da fé. “O homem é um ser político desde o berço, inserido num contexto de “polis” (vida em comum que gera a prática do diálogo, da polidez, do jogo político), mas que também desperta no indivíduo a esperança por melhoras, a fé, a crença, o respeito a Deus e aos irmãos”.  Foi essa uma das minhas muitas anotações daquele inesquecível dia. Foi mais ou menos isso o que nos passou o professor Plínio.
            Desde então, nunca mais perdi de vista as ações e pretensões daquele político diferenciado, homem de fé e de vida familiar, que teve os direitos políticos também cassados pelo AI 1, que se exilou no Chile e fez mestrado nos EUA, que ajudou na fundação do PT e o abandonou em 2005 envergonhado com o mensalão, que eleito deputado pela primeira vez em 1964 (PDC), voltou à Câmara em 1985 e disputou o governo de São Paulo em 1989, que como um Davi diante de Golias lançou sua candidatura à presidência da República em 2010, apenas e tão somente para tornar públicas suas ideias e fermentar o processo político a nível nacional. Idealista, de fato, com um pensamento socialista moderado, pois dizia que extremos não levavam a nada. Daí sua definição e opção nunca radical, de juntar o ideário cristão ao meio termo socialista. Ou, como dizia: diminuir ao menos um pouco a diferença entre ricos e pobres. Porém, de todo seu ideário político e religioso, seu grande apostolado em vida foi apregoar aos quatro ventos um pensamento político coerente com sua fé. Tanto que, durante anos, foi o pregador mais solicitado dentro da CNBB, tornando-se orador oficial em quase todas as dioceses brasileiras, quando o assunto era fé e política.
            Nosso último encontro foi em janeiro de 2012, aos pés do Cristo Redentor, no Rio. Eu de férias com minha família e ele com seus netos. Trocamos rápidas palavras e, juntos, entramos na simplória capelinha ali, no pedestal do Cristo, para demonstrarmos nossa fé num momento de oração. Ele com o mesmo sorriso e olhar amigo. Eu contemplando um gigante em sua fé, alguém que muito desejou a redenção desse País. E ambos extasiados pelo gigantismo daquele monumento a abençoar nossa pátria.
            Na trágica tarde de 8 de julho, quando o Brasil chorava a derrota vexatória de uma ilusão esportiva, Plínio Sampaio, 83, dizia adeus a seu povo, vencido por um câncer. Porém persistente em sua luta por um país mais amadurecido politicamente e justo no exercício da solidariedade cristã. Sabia que derrotas circunstanciais não destroem convicções bem semeadas. Sua fé e vida política foram coerentes até o fim.
WAGNER PEDRO MENEZES wagner@meac.com.br


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