domingo, 26 de fevereiro de 2012

AGORA É COM VOCÊ,VALDICE

AGORA É COM VOCÊ, VALDICE

            Moça ainda, foi ser freira. Ingressou na congregação Sacré-Coeur de Marie, o tradicional Colégio Sagrado Coração de Maria, na Rua Tonelero, Copacabana, Rio. Portanto, por uma dessas questões de sorte que poucos brasileiros conseguem, recebeu rígida e sólida formação, que iria nortear sua vida para todo o sempre. Mas não era bem essa sua vocação. Largou tudo e, temporariamente, foi lutar pela sobrevivência. Trabalhou como secretária da escritora carioca Nicéia Ferraz, ocasião em que teve a oportunidade de conhecer e conviver bem de perto com Dorival Caymmi e Chico Buarque, amigos da família. A eles apresentou seus dons como cantora, letrista e violonista esmerada. Chegou a compor com eles e dividir o palco em pequenas apresentações. Tinha jeito aquela jovem.
            Valdice Oliveira Santos queria mesmo era ser missionária (em qualquer lugar, até na África, se possível), pois que sua extremada devoção mariana sempre lhe dizia isso. Mas onde, oh Mãe? Conheceu Raimundo, ex-seminarista franciscano, com quem logo se identificou e casou-se. Foram viver a vida – ele como eletricista – sem no entanto abandonarem o sonho que agora sonhavam juntos: a vida missionária como leigos. Vieram para São Paulo, onde passaram a frequentar grupos de oração, dos quais logo se tornaram líderes. Mas ainda não era a missão que sonhavam. Nos anos oitenta, conheceram uma proposta cativante: fundar e organizar o OMIL,Organismo de Missionários Leigos, cuja proposta inicial era exatamente a busca de apoio para os vários grupos de leigos que atuavam missionariamente na Igreja, mas sem o respaldo desta. Dentre esses grupos estava o Meac. Apenas alguns anos e Valdice e Raimundo não titubearam: venderam tudo o que tinham, compraram uma caminhonete e partiram em missão, não sem antes pedirem a aceitação de seus nomes como membros do Meac.
            Chegaram até Feira de Santana, BA. Acolhidos pelo frei Carlos André, começaram um trabalho de missão popular. Logo conseguiram uma pequena chácara e ali se instalaram, dando início a um centro catequético que ficou conhecido como Chácara da Missão. Iniciaram um projeto grandioso, tendo como núcleo uma formosa igreja de aproximadamente 500 m2. ponta de lança de um sonho...
            Mas o sonho acabou... Em 1995, mais exatamente no diz 26 de fevereiro, Valdice faleceu, ainda na florada de uma vida, 50 anos. Quais seriam os desígnios de Deus neste momento? Muitos não entenderam. Porém, dois anos depois, o Meac realizou sua assembleia junto aos missionários leigos lá da Bahia. Eram mais de cem, todos de alguma forma despertos e orientados pela Valdice. Ainda hoje continuam numerosos e já se ramificaram em outros grupos. Porém, a maior surpresa daquela assembleia foi a necessidade de trasladar o corpo de Valdice, sepultado até então em túmulo emprestado. Mas onde colocá-la?  Não houve dúvidas: acompanhada pelos irmãos do Meac que sempre a ouviram com respeito, seguiram seus conselhos e respeitaram sua “intimidade” com a Mãe – tinha o dom da locução - fizemo-lhe um novo cortejo fúnebre. Sepultamos essa nossa irmã no local em que ela sempre desejou estar: dentro da Igreja construída por ela, na sua Chácara da Missão.
            É fácil perceber que esse sonho ainda está vivo. Talvez não conte com as ações tresloucadas daquela que levava adiante seus projetos, sem perguntar quanto isso lhe custaria. Talvez alguém pense: custou-lhe a vida. Talvez muitos ainda se perguntem: o que fazer com essa obra agora? Raimundo nos lembra: “Ela sempre foi uma mulher prudente, dedicada à missão, filha devotíssima de Maria, com inegável locução interior que sempre nos surpreendia, mas nunca fez nada em vão”.  Valdice, na sua humildade, ainda compõe versos desconhecidos, mas admirados pelo grande maestro da vida.  
WAGNER PEDRO MENEZES – Meac – 40 anos

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