domingo, 19 de fevereiro de 2012

E AGORA, JOSÉ

E AGORA, JOSÉ
Durante anos curou as dores e enfermidades de muitos, como bom farmacêutico que era. Tão bom que quase levou sua farmácia à falência; não sabia dizer não aos mais pobres. Além das receitas médicas, sabia como ninguém ler as receitas do coração... Mudou então de atividade, lidando ainda com receitas, pois que passou a distribuir bolos e salgados através de seu serviço de buffet. Esse era José Geraldo Gonçalves, o Zé Gordo para muitos ou Zé Geraldo para os amigos.
            Mineiro de Cachoeira Alegre, viveu a maior parte da vida em Belo Horizonte, onde se casou com a Néia em 1967 e com quem teve quatro filhos: Flávia, Adriana, Ivan e Flávio. Uma família guerreira desde o início, que nada de especial possuiria, não fosse o histórico de luta e de fé que sempre norteou a maioria das tradicionais famílias mineiras. A princípio, Néia e Zé formavam um casal devotado a solidificar seus patrimônios com muito trabalho e objetividade. Nada mais justo. Mas, nessa busca, esqueceram-se de conciliar os planos de Deus. “Eu longe de Deus e Deus sempre por perto”..., desabafou em seu diário.  Um encontro cristão foi a gota d´água. Desde então, buscou com todas as forças recuperar o tempo perdido, envolvendo-se de corpo e alma nas atividades e movimentos de sua paróquia. “Foi o início de nova caminhada em minha vida. Seria fácil? Seria difícil? Nada disso era, agora, importante” – concluía.
            Em 1980 conheceram o Meac, o grupo de missionários leigos que iria mudar suas vidas para sempre. Apaixonou-se à primeira vista e no mesmo ano apresentou-se ao grupo, em Campos do Jordão, como candidato a membro. Estava disposto a tudo, para inserir-se naquele trabalho missionário. Foi aconselhado a voltar a Belo Horizonte e ali descobrir uma maneira de desempenhar sua missão, dentro do Meac, através de uma obra qualquer. Uma obra? O que seria... “Conhecedores que éramos dos problemas da juventude – a quem há 10 anos dedicávamos parte de nossa vida – resolvemos que o menor carente abandonado, futuro delinqüente marginalizado pela sociedade, seria a nossa opção de trabalho”. Um ano depois lançavam a pedra fundamental do Lar de Maria, em Sabará, cidade satélite de BH.
            Em 1985, 25 de maio, apenas quatro anos depois de iniciada, inauguravam a primeira ala de uma imensa creche com instalações “dignas de primeiro mundo”, pois que fugia totalmente do acanhado padrão das creches do governo. Donde os recursos? Da fé, unicamente da fé e das doações dos inúmeros “padrinhos” daquele sonho que o Zé e a Néia ousaram realizar. Fácil assim? Não tão fácil se nesse meio tempo o Zé não adquirisse um câncer! Assim o Zé nos descreve esse fato: “Minha estrutura física e mental balançou. Senti calafrios: estava confirmada a seriedade do problema. O primeiro passo foi uma cirurgia para extrair meu baço. As biópsias mostraram que a doença já estava no 3º. estágio”. Mesmo assim, continuou seu projeto, ao mesmo tempo em que se submeteu a todas as etapas de tratamento que a doença exigiu. Venceu o câncer. Construiu o Lar de Maria.
            Em maio de 1990 a creche completava cinco anos. O Lar de Maria tornou-se uma referência de tratamento digno às crianças por ele atendidas. Zé dá início ao Lar de José, com funções profissionalizantes, como panificadora, carpintaria, corte e costura, etc e já fala num terceiro projeto, o Lar do Menino Jesus, destinado a abrigar idosos. Eta Zé! O câncer? Ora, quem diz que essa doença o infernizou um dia?  Outubro. Faz uma visita ao grupo do Meac da Bahia, unicamente para lhes dar uma palavra de incentivo. Volta feliz com o que viu por lá. 24 de outubro: seu coração grandioso não mais cabe em seu peito angustiado por tantas carências e tantos sonhos. A notícia corre solta: o Zé morreu! “Ele deve ter tido tanto amor pelos pequeninos que seu coração explodiu num enfarto fulminante”, comenta um colega do Meac. E agora, José?
WAGNER PEDRO MENEZES – Meac – 40 anos


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